Alex Steffen

Chega… já chega! Era uma vez um desastrado!

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Recém acordado de mais um sonho estabanado, tirou os seus quase 130 da cama e caminhou até o banheiro. Lavou o rosto e se deparou com uma criatura estranha. Não era ele. Não poderia ser. Os olhos haviam perdido o brilho. As bochechas tinham marcas profundas do travesseiro. A barba estava gigantesca.

– Epa, mas que porra é essa? – falou sozinho, vendo um balde e meio de remela na cara.

Não sabia mais o que fazer.

Estava entediado. Sôfrego. Irado. O mundo perdera a graça.

Sozinho, largado às traças, amargava os dias que a sua amada estava longe. O telefone não tocava mais. O cachorro do vizinho não mais uivava. Vivia um vazio que jamais imaginara ser possível viver. Estava vazio de si mesmo. Cansara. Cansara daquilo tudo e resolvera mudar o quadro.

Foi para o pátio de casa, pegou a máquina de aparar gramas. Tudo errado. Ou melhor, nada de errado ocorreu. Tudo errado para ele, pois não se machucou. Não cortou as roseiras. Não pisou em rosetas. Algo estava de fato diferente. Os desastres, até então habituais, não haviam ocorrido. Nem na ensaboada calçada ele caíra. Seu mundo, desastrado e desgraçado mundo, precisava ter um fim.

Mas como fazer isso? Sua famosa onda de azar já não era mais a mesma. Tinha que ter certeza de que tudo iria frutificar.

Durante dois longos dias planejou. Pensou e executou o plano à risca.

Foi à farmácia e comprou uma dose cavalar de remédios. Tinha de tudo naquele coquetel. Overdose seria pouco para acabar com a vida.

Carregou a calibre 12 e ajustou um dispositivo sobre a estante de livros. Tudo cronometrado a partir do momento que ele decidisse morrer. A arma viria a disparar para dar em meio à sua testa.

Não confiou apenas na balística e buscou uma corda. Daquelas de nylon, azuis e brancas, e a colocou a frente da estante. Pegou uma cadeirinha, já com as pernas bambas, e prendeu a junção de fios no gancho que havia no teto.

Tudo parecia certo. Ou morreria envenenado. Ou enforcado. Ou com tiro entre os vesgos olhos. Leu duas bulas das medicações que comprara e tomou três cartelas de uma só vez. Misturou uns quatro tipos de remédios pra ter certeza. Abriu a gaveta e viu outras pílulas por ali. Tomou também. Ajustou o dispositivo remoto que fizera para a arma. Em cinco minutos ela dispararia. Botou o laço no pescoço e subiu na cadeirinha.

Iria se matar. Não tinha dúvida. Qual é a graça de uma vida sem desgraças?

A mulher que aprendera a ser desastrada com ele não aguentara o repuxo. Era o fim. Pronto. Era o fim. 2 minutos e 30 segundos. E a certeza só aumentava. Não, não era covarde em pensar em se matar. O problema era só dele. Não tinha filhos, irmãos ou pais para que herdassem qualquer coisa.

1 min e contando. A regressiva seguia e ele encarava o cano da 12. Faltavam 11, 10, 9, 8…

Ficou nervoso. Absurdamente nervoso. Uma flatulência inesperada se apresentou. Pesou a calça. Escorreu uma torrente diarreica pelas pernas… 3, 2…

Desequilibra-se. A perna da cadeira cede. O corpo pende à corda. 1… zero. Quando o ar lhe falta a arma dispara, queimando o couro cabeludo e rompendo a corda. O teto de gesso veio à baixo. O tiro atingiu a tevê curva de 65 polegadas. E… boooommmmmm. Tudo parecia ter acabado.

Duas horas depois acordava, tendo a sua frente a mulher (que fora chamada pelos vizinhos). O inevitável havia ocorrido. Eita desgraceira danada. Estava no chão. Fedido como se tivesse caído no vaso sanitário. Do quarto-sala pouco sobrara. Ele, bem, estava vivo… e, pasmem, o colchão d’água inteirinho da silva. Ergueu-se com uma dificuldade monstro, é claro, surfando em meio ao escorregadio piso que um dia foi branco.

Foi ao chuveiro que, evidentemente, estava sem uma gota de água. Chorou de alegria. Sua desgraceira voltara ao normal. Não precisava se matar. Não precisava mesmo. A vida daria conta disso, em algum dia.

Quando sentou na cama, viu a sua mulher com as caixinhas de medicamentos na mão, às quais ela beijava insistentemente. Nunca doses de lactopurga misturado a cialis salvaram a vida de um homem como momentos antes. Espelho não havia para que ele pudesse se ver, mas percebeu que algo mais estava bem vivo. Olhou para a mulher e se jogou sobre ela. Na cama. Se amaram de maneira louca por algumas horas, até que a tragédia seguinte se deu.

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